19/09/2010

Miguel Torga



Julien Dupré
Gosto de Miguel Torga. Não será dos nossos escritores, o mais popular, porém, tem algo que me encanta. Talvez a sua ruralidade muitas vezes tão bem expressa no que escreve. A sua escrita é simples e sensível 
Miguel Torga nasceu em S.Martinho de Anta-Sabrosa (Vila Real) em 1907 e morreu em 1995.


"(...) Proveniente de uma família humilde, teve uma infância rural dura, que lhe deu a conhecer a realidade do campo, sem bucolismos, feita de árduo trabalho contínuo. Após uma breve passagem pelo seminário de Lamego, emigrou com 13 anos para o Brasil, onde durante cinco anos trabalhou na fazenda de um tio, em Minas Gerais, como capinador, apanhador de café, vaqueiro e caçador de cobras. De regresso a Portugal, em 1925, concluiu o ensino liceal e frequentou em Coimbra o curso de Medicina, que terminou em 1933. Exerceu a profissão de médico em São Martinho de Anta e em outras localidades do país, fixando-se definitivamente em Coimbra, como otorrinolaringologista, em 1941."
Para saber mais sobre o autor clique aqui
Eis alguns poemas de Miguel Torga:


Quase um Poema de Amor
Há muito tempo já que não escrevo um poema 
De amor. 
E é o que eu sei fazer com mais delicadeza! 
A nossa natureza 
Lusitana 
Tem essa humana 
Graça 
Feiticeira 
De tornar de cristal
A mais sentimental 
E baça 
Bebedeira. 
Mas ou seja que vou envelhecendo 
E ninguém me deseje apaixonado, 
Ou que a antiga paixão 
Me mantenha calado 
O coração 
Num íntimo pudor, 
— Há muito tempo já que não escrevo um poema 
De amor. 

Frustração
Foi bonito 
O meu sonho de amor. 
Floriram em redor 
Todos os campos em pousio. 
Um sol de Abril brilhou em pleno estio, 
Lavado e promissor. 
Só que não houve frutos 
Dessa primavera. 
A vida disse que era 
Tarde demais. 
E que as paixões tardias 
São ironias 
Dos deuses desleais. 

Súplica
Agora que o silêncio é um mar sem ondas, 
E que nele posso navegar sem rumo, 
Não respondas 
Às urgentes perguntas 
Que te fiz. 
Deixa-me ser feliz 
Assim, 
Já tão longe de ti como de mim. 
Perde-se a vida a desejá-la tanto. 
Só soubemos sofrer, enquanto 
O nosso amor 
Durou.
Mas o tempo passou, 
Há calmaria... 
Não perturbes a paz que me foi dada. 
Ouvir de novo a tua voz seria 
Matar a sede com água salgada. 

Prospecção
Não são pepitas de oiro que procuro.
Oiro dentro de mim, terra singela!
Busco apenas aquela
Universal riqueza
Do homem que revolve a solidão:
O tesoiro sagrado
De nenhuma certeza,
Soterrado
Por mil certezas de aluvião.
Cavo,
Lavo,
Peneiro,
Mas só quero a fortuna
De me encontrar.
Poeta antes dos versos
E sede antes da fonte.
Puro como um deserto.
Inteiramente nu e descoberto.


Comunicado


Na frente ocidental nada de novo.
O povo 
Continua a resistir.
Sem ninguém que lhe valha,
Geme e trabalha
Até cair.

8 comentários:

estouparaaquivirada disse...

Sem saberes, dás-me um presente inesperado!
Se fosse vivo o meu pai faria hoje anos e um dos escritores preferidos dele era o Torga, por isso este post foi especial para mim...
xx e obrigada

MagyMay disse...

E como me encantei ao ler estes poemas...
Relembrar um escritor multifacetado.

Boa Semana, para ti

Isa GT disse...

Pois eu também aprecio Miguel Torga e revisitá-lo, é sempre agradável :)

Bjos

Alberto Oliveira disse...

Torga é um dos mais genuinos escritores portugueses. O sentir a alma lusitana (para o melhor e para o pior... ) está bem expresso no poema "Quase um Poema de Amor" que editas neste post.

Fosse eu músico e paria daqui um belo fado.

Unknown disse...

Boa edição.

Seguramente que leste também «A CRIAÇÃO DO MUNDO»
No Terceiro Dia, se bem me lembro, cheguei a levantar-me de madrugada para o terminar.
Foi fantástico.

Bjs

Luna disse...

Também gosto deste poeta tem poemas lindos,assim como estes que escolheste
Bj

Rosa dos Ventos disse...

Gosto muito de Miguel Torga, quer como contista quer como poeta!
Obrigada pelo presente.

Abraço

Lilá(s) disse...

Tem poemas bem lindos e estes não conhecia, gostei.
Beijos